A Agência Nacional do Petróleo (ANP) estuda uma série de mudanças na distribuição e venda de combustíveis no país. Uma das alterações que poderão influenciar a vida do consumidor é a redução de três para duas casas decimais no preço da gasolina. Segundo fontes do setor, a ANP pretende também adotar novas medidas para tornar mais rigoroso o critério de entrada de novas distribuidoras no mercado.
A alteração do preço da gasolina atende a um pleito dos órgãos de defesa do consumidor. Mas representantes de postos e distribuidoras acreditam que a medida pode ser ruim para o bolso do brasileiro. Eles dizem que poderia haver um “arredondamento” do preço para cima. As mudanças fazem parte da atualização de duas resoluções que regem as áreas de distribuição e revenda, que têm mais de dez anos.
— A ideia é acabar com o milésimo. E, assim, simplificar a vida do consumidor. Em vez de os postos venderem gasolina a R$ 2,999, o valor cobrado será de R$ 2,99. A mudança vai para consulta pública neste primeiro trimestre — disse uma fonte a par das mudanças.
‘Posto vai arredondar para cima’
Em entrevista ao GLOBO, o superintendente de Abastecimento da ANP, Aurélio Amaral, confirmou os estudos em relação à atualização da regulamentação nos dois setores. Ele explicou que a redução das casas decimais na venda dos combustíveis será avaliado pela ANP, atendendo à reivindicação de órgãos de defesa do consumidor.
— As discussões sobre a resolução da revenda estão numa fase muito embrionária — garantiu Amaral.
Paulo Miranda, presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis (Fecombustíveis), acredita que a proposta de modificação do preço pode encontrar resistência entre os postos e até elevar o preço da gasolina para o consumidor. Isso porque, diz ele, a terceira casa decimal ajuda a compor o faturamento bruto da rede.
— Se tiver necessidade, o posto vai arredondar o preço para cima. O dono do posto tem uma planilha e analisa o ganho da operação. Mas o setor hoje é muito competitivo. Então, um centavo mais caro que o posto vizinho pode afugentar clientes. O que dita o preço hoje é a concorrência — disse Miranda.
Miranda frisa que a redução na casa decimal não vai acarretar prejuízo para o consumidor entre o valor pago e o volume de combustível. Existem hoje no Brasil quase 40 mil postos.
— A mudança vai encontrar resistência, pois os postos vão querer tratamento igual em relação às distribuidoras, que compram da Petrobras. Mas, apesar de ter consulta pública, a ANP tem poder para tomar a decisão.
Segundo o advogado Hélio Alves, a forma atual de cobrança induz o consumidor a achar que o preço é menor:
— Há um entendimento de que o consumidor é prejudicado, pois R$ 2,999 é R$ 3, o que é diferente de R$ 2,99. A informação tem de ser clara.
A cobrança de três casas decimais, lembra Alísio Vaz, presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), é adotada em países da Europa e nos Estados Unidos. Por isso, ele acredita que a mudança não é necessária.
— Acho que isso é uma perda de foco. O problema para o consumidor é a adulteração. A redução da cada decimal pode arredondar o preço para cima, pois os postos, que vão perder em faturamento, terão de se ajustar.
Estoque mínimo para distribuidores
A redução das casas decimais nas bombas, segundo Aurélio Amaral, faz parte da revisão da Resolução 116, de 2000, que trata da revenda de combustíveis. Segundo ele, a mudança está em discussão ainda a nível técnico e deverá ser posta em consulta pública ainda este ano. Mas Amaral não definiu uma data para isso.
— Essa questão da redução da casa decimal na venda dos combustíveis sequer foi apreciada internamente. Não tem decisão alguma.
Além das mudanças na área de revenda, a ANP prepara nova minuta que definirá as alterações da resolução 202, de 1999, sobre o setor de distribuição. Segundo Amaral, a proposta vai para consulta pública até o fim deste mês.
— Possivelmente se proporá requisitos mais seletivos para a entrada de novas distribuidoras no mercado.
O superintendente não detalhou as mudanças. Mas, segundo uma fonte do setor, entre as alterações, estão a exigência de que as novas companhias tenham estoque mínimo (para gasolina e etanol) e que a sua primeira base de armazenamento seja própria.
— Para ser distribuidor, o capital mínimo da empresa passará a ser de R$ 3 milhões, e não de R$ 1 milhão como é hoje. O valor atual é muito baixo. É como se qualquer um conseguisse ser um distribuidor. Uma outra alteração é que será proibida a venda de combustíveis entre os distribuidores — disse a fonte.
Miranda, da Fecombustíveis, vê com bons olhos as mudanças em estudo. Diz que as ações são importantes para evitar falta de combustível, como ocorreu, de forma pontual, em algumas cidades este ano.
— As mudanças são necessárias para manter o abastecimento. Em 2012, o consumo de combustíveis cresceu seis vezes acima do avanço da economia.
Segundo Vaz, do Sindcom, a ANP deveria ainda exigir regularidade fiscal das empresas.
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